quinta-feira, 1 de junho de 2017

Contas Nacionais do primeiro trimestre de 2017: ainda não temos o que comemorar.

Saíram as contas nacionais relativas ao primeiro trimestre de 2017 (link aqui e aqui), depois de uma sequência de quedas o PIB voltou a crescer. Foi o suficiente para o governo comemorar e anunciar o fim da recessão (link aqui), eu não seria tão rápido em abrir o champanhe. Primeiro porque os dados não refletem os impactos da delação da turma da JBS; segundo porque, mesmo ignorando as delações, o crescimento do primeiro trimestre não parece muito robusto; terceiro porque houve mudanças metodológicas que afetam o resultado e por fim depois de tantas quedas um crescimento em um trimestre relativo ao anterior não é exatamente algo a ser comemorado com muito barulho.

A figura abaixo mostra o crescimento do PIB quando comparados os últimos quatro trimestres com os quatro trimestres anteriores, o atual trimestre com o trimestre anterior, o atual trimestre com o mesmo trimestre do ano anterior e o acumulado ao longo deste ano com o acumulado ao longo do mesmo período do ano anterior. Repare que pelo primeiro critério, o que captura os últimos doze meses, o PIB caiu 2,3%. Repare também que quando comparado ao trimestre anterior o PIB caiu 0,4%. O aumento só aparece quando são comparados o primeiro trimestre de 2017 com o último trimestre de 2016 e após o ajuste de sazonalidade.




Comecemos analisando o festejado 1% de crescimento neste trimestre em comparação ao trimestre anterior. A figura abaixo mostra o crescimento dos componentes do PIB pela ótica da despesa e pela ótica da produção. Pelo lado da despesa houve queda no investimento, no consumo das famílias e no consumo do governo, vale destacar que desta vez o esforço de contenção de gastos do governo foi maior que o das famílias. Como as importações entram de forma negativa no cálculo do PIB o único componente que puxou a despesa para cima foram as exportações. Isso significa que o crescimento da despesa ocorreu por conta do resto do mundo, isso não necessariamente é bom ou ruim, mas merece registro.




Na ótica da produção os serviços, maior de todos os setores, teve crescimento zero, ou seja, ficou parado e a indústria cresceu 0,9%. O crescimento significativo ocorreu na agropecuária que aumentou o valor da produção em 13,4% quando comparado ao último trimestre de 2017. Juntando o lado da produção com o da despesa é possível concluir que o crescimento for praticamente todo devido ao aumento da venda de produtos agropecuários para o exterior. Nada de muito surpreendente, mas não pode ser creditado à política econômica. O festejado crescimento foi um choque externo positivo.

Quando comparamos o primeiro trimestre de 2017 com o primeiro trimestre de 2016 observamos uma queda de 0,4% no PIB. A figura abaixo mostra o crescimento do PIB pela ótica da despesa e pela ótica da produção. Assim como na comparação com o trimestre anterior a análise pela ótica da despesa mostra queda no consumo das famílias, no consumo do governo e no investimento. Porém, nesta comparação, o esforço das famílias foi maior que o do governo, o que mostra que o governo vem aumentando o esforço de contenção de gastos de consumo. A queda significativa do investimento mostra que uma recuperação consistente da economia ainda não está no horizonte.



Pelo lado da produção houve queda 1,7% nos serviços e de 1,1% na indústria, mais uma vez a agropecuária salvou o período com crescimento de 15,2%. Confundir choques positivos vindos do exterior com uma trajetória de crescimento sustentando é um erro que não podemos cometer novamente. Tais choques devem ser vistos como uma oportunidade de compensar efeitos negativos de curto prazo de reformas estruturais e do ajuste fiscal.

Na agricultura receberam destaque do IBGE a soja, crescimento de 17,5% na quantidade produzida, o milho (46,8%), o arroz (13,5%) e o fumo (28,4%). Na indústria a queda não foi maior por conta da indústria extrativa mineral, que cresceu 9,7%, assim como a agropecuária tal crescimento foi devido a fatores externos. A indústria da construção civil uma queda de 6,3% e, o aprofundamento da incerteza por conta da crise política, pode adiar a recuperação desse setor. No setor de serviços vale destacar a queda de 2,5% no comércio, atacado e varejo, comportamento consistente com a contração o consumo das famílias.

A comparação com os quatro últimos trimestres, que reflete o desempenho da economia no último ano corrido o PIB caiu 2,3%. Assim como as figuras anteriores a figura abaixo ilustra a variação do PIB nesta comparação. Tanto pela ótica da despesa quando pela ótica da produção o único crescimento observado foi na agropecuária. A queda de 6,7% do investimento dá a dimensão da crise que estamos passando.




Olhando um maior período de tempo fica claro que menos que uma recuperação estamos vivendo uma diminuição da intensidade da queda, tal diminuição começou no terceiro trimestre de 2016. Como já foi discutido aqui no blog o Brasil passa por duas crises econômicas (link aqui). Uma de curto/médio prazo que está associada aos desequilíbrios macroeconômicos do governo Dilma e dos erros de política que começaram lá por 2006, outra de longo prazo que é caracterizada pelo baixo crescimento da produtividade nas últimas décadas. A redução no ritmo de queda do PIB está relacionada as expectativas de melhoras na política macroeconômica e na reversão das políticas erradas, mas, por mais importante que sejam, expectativas sozinhas não movem moinhos. Para que saiamos da crise de curto médio/prazo é necessário que pelo menos ocorra um ajuste fiscal e um controle da inflação. Os números mostram que tais medidas estão em andamento, o grande perigo é que a crise política leve o governo a rever tais medidas e a apostar em estímulos que podem ter efeitos de curtíssimo prazo ao preço de agravar mais ainda as duas crises que vivemos.



Um último ponto a ser comentado é o aumento da taxa de poupança que foi de 13,9% no primeiro trimestre de 2016 para 15,7% no primeiro trimestre deste ano. O valor ainda é baixo, mas o aumento da taxa de poupança no meio de uma crise pode ser um sinal que estamos começando a nos preocupar mais com o futuro. Ademais, por conta da queda na taxa de investimento, a taxa de poupança ficou maior que a taxa de investimento que foi 15,6% neste trimestre. Assim como outros números de comércio exterior a taxa de poupança ficar acima da taxa de investimento não é algo necessariamente bom ou ruim, mas merece ser registrado.


Um comentário:

  1. Perfeito!
    Mais uma vez constatamos que tudo o que temos são indicadores manipulados.

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